O fato da legislação do Simples
Nacional não agregar na sua sistemática o ICMSdevido na substituição tributária,
bem como o diferencial de alíquota do ICMS, vem impactando bastante nos negóciosdas micro e pequenas empresas optante por esse regime tributário. Além do recolhimento do tributo unificado previsto
nas diversas tabelas que compõe esse regime, a Lei impõe a essas empresas o
ônus adicional do ICMS-ST quando ocorre a circulação de mercadorias sujeitas asubstituição tributária,
e o diferencial de alíquotas do ICMS, por força de aquisições interestaduais.
A observância dessas regras trouxe aos optantes do Simples Nacional
não só o custo tributáriodireto incidente sobre a comercialização dos seus
produtos, mas também a árdua tarefa de precificar com exatidão os seus itens de
estoque e emitir corretamente os respectivos documentos fiscais, sobretudo
quando há operações interestaduais. Para ser assertivo na aplicação da
tributação, o micro e pequeno empreendedor se
vê num emaranhado de leis, decretos, portarias, protocolos, convênios e demais
dispositivos legais pertinentes ao seu estado e demais unidades da federação
onde se localizam seus clientes e fornecedores, o que o coloca numa verdadeira
selva tributária no momento de realizar as suas operações.
Breve histórico da legislação
Paulista
Avaliando a situação das MPE’s ao longo do tempo verificamos que
no estado de São Paulo as
vantagens tributárias justas e constitucionais concedidas às Micro e Pequenas
Empresas vêm diminuindo drasticamente. Quem não se lembra do “Simples
Paulista”, que concedia “isenção” deICMS às Micro
Empresas, e ainda mantinha um “redutor” no ICMS devido
pelas Pequenas Empresas? Pois é, a partir de julho/2007 esses
benefícios foram extintos, dando lugar ao Simples Nacional, onde o ICMS é exigido
de todos os optantes com atividade mercantil independentemente do seu porte.
Para piorar, a partir de 2008 o estado de São Paulo, que era tímido na aplicação dasubstituição tributária,
intensificou de forma desenfreada a entrada de inúmeros produtos dentro dessa
sistemática, e praticamente neutralizou qualquer vantagem tributária das MPE’s
relacionada ao ICMS, diminuindo a competitividade dessas empresas.
Sem a pretensão de adentrar nos complexos aspectos técnicos do
instituto da SubstituiçãoTributária do ICMS, ressaltamos que nessa sistemática temos a figura do
substituto tributário, aquele que atua no início da cadeia de
comercialização, que geralmente são as indústrias e importadores, incumbido de
recolher o ICMS substituição relativo
à todas as supostas operações subsequentes realizadas pelos substituídos
tributários, compostos, em grande maioria, porvarejistas, onde se encontram uma gama imensa de optantes pelo
Simples Nacional. A essência dasubstituição tributária
é concentrar o controle e o recolhimento do tributo no substituto tributário, sendo muitos não optantes pelo Simples Nacional, e
que venderão os seus produtos a empresas enquadradas na condição de
substituídos cujo valor do ICMS substituição está
embutido nos respectivos preços. Assim, os varejistas optantes
do Simples Nacional amargam esse tributo intrinsecamente no preço cobrado pelo
seu fornecedor, e aqui reside um grande problema, pois, além da substituição tributária
colocar as MPE’s numa competição desigual com as médias e grandes empresas,
geralmente o prazo que o pequeno varejista tem
para pagar o seu fornecedor é menor que o prazo médio de recebimento das suas vendas, o que acaba causando um enorme descompasso no seu
fluxo de caixa. Aliada a essa anormalidade há também uma grande injustiça, pois
o fornecedor substituto tributário, que em média recebe num prazo de 28 dias do seu
comprador varejista, acaba tendo 60 dias, fora o mês corrente, para
pagar o ICMS substituição que
foi embutido no preço do produto vendido e já recebido. Isso demonstra uma
flagrante inversão de valores, pois as micros e pequenas empresas, na condição
de substituído tributário que
deveriam ter vantagens tributárias, acabam arcando com o ICMS substituição antes
mesmo de terem recebido pela venda dos seus produtos, enquanto que o seu
fornecedor, na condição de substitutotributário, que são muitas vezes empresas médias e grandes,
detém os benefícios tempestivos determinados pela substituição tributária.
Muitas MPE’s optantes pelo Simples Nacional adquirem mercadorias
oriundas de outras unidades da federação que não mantém convênio e/ou protocolo
de substituição tributária
com o estado de São Paulo. Contudo, muitas vezes o produto adquirido pela MPE
paulista está sujeito a substituiçãotributária internamente no estado de São Paulo, e aí entra a antecipação da substituição tributária
do ICMS, que exige dos contribuintes paulistas a observância
dessa obrigatoriedade e o respectivo recolhimento do ICMS-ST antecipado no momento da entrada da mercadoria no
território paulista. Assim, o recolhimento do ICMS-ST antecipado quita esse tributo em todas as operações
subsequentes relacionada ao produto sujeito a substituição tributária.
Porém, em alguns casos, o produto que teve a incidência do ICMS-ST antecipado quando da sua aquisição pode ser vendido
para outra unidade da federação que não mantém acordo com São Paulo em
relação a substituiçãotributária, exigindo do remetente o destaque e
apuração do ICMS normal,
ocasionando um novo pagamento desse tributo.
Para solucionar e eliminar essa dupla tributação, a legislação
paulista permite que se recorra à Portaria CAT 17/99, pois, através dos
requisitos exigidos por essa norma, é possível o ressarcimento do ICMS-ST antecipado pago indevidamente. No entanto, as
minúcias, a complexidade, a burocracia, e a morosidade a ser enfrentada durante
o processo determinado pela referida portaria é um pesadelo, e impõe às MPE’s
optantes pelo Simples Nacional uma “missão quase impossível” de reaver o
tributo estadual. Só para ter uma ideia, esse mecanismo de ressarcimento é
temido até pelas médias e grandes empresas que, “em tese”, possuem controles
internos mais ricos e detalhados e que supostamente teriam todos os elementos
para cumprir a referida portaria.
Diferencial de alíquota do ICMS
Com o pretexto de proteger os seus contribuintes, e, sobretudo, a
respectiva arrecadação, a imensa maioria dos estados brasileiros exige
das empresas optantes pelo Simples Nacional o diferencial de alíquota do ICMS quando
estas adquirem mercadorias oriundas de outras unidades da federação. Essa forma
de tributação consiste na cobrança da diferença entre a alíquota interna de ICMS exigido
pelo ente federativo de destino e a alíquota aplicada na operação interestadual
quando esta for menor, cujo recolhimento é efetuado de forma isolada.
Nas empresas não optantes do
Simples Nacional o referido diferencial de alíquota é mais brando, pois somente
é exigido nas aquisições interestaduais de produtos destinados ao seu ativo
imobilizado, e/ou de materiais de uso e consumo, ou seja, as compras de
matérias primas e mercadorias estão fora do alcance desse tributo antecipado.
Contudo, as Micro e Pequenas Empresas optantes do Simples Nacional
não tem o mesmo abrandamento dispensado às demais pessoa jurídicas, muito pelo
contrário, pois a maioria das unidades da federação faz com que os seus
contribuintes do Simples Nacional amarguem o recolhimento desse indigesto
tributo antecipado, e ainda exigem novamente este imposto estadual
na operação de venda, quando o produto não estiver sujeito a substituição tributária,
prejudicando a sua competitividade e o seu fluxo de caixa. Muitas vezes as
pequenas empresas descobrem interessantes oportunidades de negócios na
revenda de produtos não sujeitos a substituiçãotributária oriundos de outros estados, mas com o
ônus do diferencial de alíquota do ICMS na compra,
acrescido do ICMS incidente
sobre a venda, a transação acaba sendo inviabilizada, e a lucratividade
totalmente comprometida.
Para elucidar de forma prática o ônus tributário sofrido
pelas empresas do Simples Nacional, desenhamos um cenário muito comum,
considerando como premissa a aquisição de mercadoria oriunda de outra unidade
da federação por uma empresa paulista cuja alíquota interestadual foi de 12%,
margem bruta de lucro é de 25%, e a alíquota interna do ICMS de 18%:
Assim, aplicando os referidos cálculos numa empresa optante do
Simples Nacional que se encontra na última faixa da tabela, cuja fatia do ICMS é de 3,95%,
e noutra, não optante desse regime, inferimos que o custo efetivo do ICMS na pessoa
jurídica do Simples Nacional é de 8,75%, contra 8,40% nas demais empresas
enquadradas no regime periódico de apuração (RPA), o que é uma aberração, pois,
além de anular a vantagem tributária a que as empresas do Simples Nacional
deveriam ter direito, a exigência acaba onerando o lado com menor poder de
barganha doempreendedorismo.
É importante ressaltar que felizmente o estado de São Paulo inseriu
na sua legislação o § 8º, XV-A, do Art. 115, do RICMS/SP que determina que a
alíquota interestadual do ICMS a ser
considerada para as empresas do Simples Nacional sempre será de 12% para fins
de cálculo do diferencial de alíquota, independentemente do percentual
destacado no documento fiscal emitido por fornecedor sediado em outra unidade
da federação, o que torna a situação menos ruim para as empresas paulistas do
Simples Nacional. Contudo, o estado de São Paulo ainda
não se manifestou sobre aplicabilidade dessa regra nas operações interestaduais
com produtos importados contemplados na Resolução do Senado Federal 13/2012 que determina
a incidência da alíquota de ICMS de 4%, o
que provoca nas empresas do Simples Nacional grande insegurança jurídica na
apuração dos seus tributos.
A legislação do ICMS de muitos
estados brasileiros aplica o diferencial de alíquota aos optantes do Simples
Nacional considerando rigorosamente a alíquota destacada no documento fiscal de
entrada que acoberta a operação interestadual, de modo que o optante do Simples
Nacional, além de se deparar com a situação desfavorável já mencionada, também
será prejudicado nas operações de aquisições de mercadorias oriundas de outros
estados com alíquota interestadual de 4% e 7%. Assim, se valendo das mesmas
premissas utilizadas no exemplo anterior que considerou a alíquota
interestadual de 12%, nestes casos também constatamos que as empresas do
Simples Nacional amargariam um ICMS efetivo
maior que as demais empresas. Os cálculos demonstraram que nesses casos a
pessoa jurídica optante pelo Simples Nacional teria um ICMS efetivo de
15,15% e 12,75%, contra 14,80% e 12,40% respectivamente nas demais empresas
enquadradas no regime periódico de apuração (RPA), o que seria mais uma
anomalia tributária em detrimento aos optantes do simples nacional, conforme
demonstramos:
Considerações finais
Na defesa de seus interesses arrecadatórios, os estados
brasileiros certamente vislumbraram nasubstituição tributária
e no diferencial de alíquota um extraordinário instrumento de controle dos seus
contribuintes conjugado com a alavancagem e preservação dos seus tributos. A
eficácia desse mecanismo, aliada ao uso da tecnologia no combate a sonegação, é refletida na arrecadação doICMS no estado
de São Paulo que de 2006 a 2011 aumentou
115,70% em termos reais, já descontando a inflação apurada pelo IPCA do
período. Contudo, algo precisa ser feito em favor das Micros e Pequenas
Empresas optantes pelo Simples Nacional com o objetivo de desonerar essas
empresas desses dois perversos tributos estaduais, de forma que se estabeleça
um ambiente denegócios favorável
as empresas menores, até porque são elas responsáveis por 52% dos empregos
formais no país, segundo estudo do SEBRAE em
parceria com o Instituto Brasileiro de Qualidade e Produtividade (IBQP). Também
é importante ressaltar que a carga tributária e a complexidade da legislação
também contribuem para alta taxa de mortalidade precoce das MPE’s, que até vem
diminuindo nos últimos anos, mas ainda é preocupante.
Incentivar as micro e pequenas empresas brasileiras com
desonerações tributárias estaduais certamente também beneficiará o
desenvolvimento da própria unidade da federação onde estas estão sediadas.
Nesse sentido, felizmente temos acompanhado algumas ações isoladas, como a do
estado de Santa Catarina, que apesar
de não ser a solução ideal, concedeu às MPE’s uma importante redução de 70% nas
margens de valor agregado (MVA) utilizadas no cálculo dasubstituição tributária
de diversos produtos, o que certamente aliviou e deu algum oxigênio adicional
aos negócios dessas
empresas. Portanto, entendemos que estimular as MPE’s com benefícios fiscais
não deve ser encarado como uma benesse concedida pelo governo, mas como um dever constitucional que o ente
tributante tem para com essas empresas, e que seguramente repercutirá não só no
desenvolvimento das Micros e Pequenas Empresas optantes pelo Simples Nacional,
bem como no progresso dos municípios, estados e da união.